Relato do encontro de 45 primaveras de luta pela Ponta do Coral

No dia 05 de outubro o sol resolveu nos agraciar com sua ilustre presença para o encontro de 45 primaveras de luta pela Ponta do Coral, após dois adiamentos consecutivos do evento.

Aos poucos as pessoas foram se aprochegando, e preparando o cenário, pendurando faixas e cartazes e amarrando as tiras de tecido vermelho e verde, cores do Movimento Ponta do Coral 100% Pública que viraram uma “marca registrada” dos eventos na Ponta.

Uma roda de conversa foi formada, contando com pessoas de diferentes gerações, que construíram essa e também outras lutas. A Roda começou com um convite para compartilhamento das memórias sobre a Ponta do Coral.

Mauro Passos, iniciou as falas, contando sobre a história do local desde os tempos que era utilizado como depósito de combustível para a Standard Oil até a década de 30, passando pelo aterramento para construção da beira-mar norte, quando se tornou a última “ponta” de entrada natural para o mar, e o incêndio no educandário e abrigo de menores que marcou a venda irregular da Ponta ainda na ditadura. Mauro Passos também lembrou da trajetória da luta legislativa quando foi vereador pelo PT, quando encaminhou no ano 2000 um projeto de lei que transformava a região em Área Verde de Lazer (AVL), aprovado naquela conjuntura por unanimidade.

Dando seguimento, Gert Shinke, historiador e membro do coletivo Ecolhar, que trouxe um “faixão” celebrando os 45 anos de resistência, colocou na roda documentos históricos desta época da luta, com os laudos e ofícios dos órgãos públicos responsáveis.

Lino Peres contou como a lei depois foi modificada pelos vereadores em anos seguintes, com alterações que permitiam a construção de um hotel de mais de 20 andares com uma marina, o que levou a uma nova fase de mobilizações pela Ponta. Lino também recordou as primeiras mobilizações nos anos 80, puxadas por estudantes e professores, principalmente do curso de Arquitetura da UFSC, destacando a participação dos então estudantes Loureci Ribeiro (Ci) e Elisa Jorge, que se tornarão militantes pelo direito à cidade e da luta pela moradia, e seguiram na construção da luta pela Ponta do Coral 100% Pública. Recordou também os embates na câmara de vereadores, quando foi vereador pelo PT, para a Ponta voltar a ser uma AVL.

Suzana Luz Cardoso, ativista socioambiental, recordou o histórico de mobilizações pela Ponta do Coral de 2015 em diante, quando começou a participar do movimento, que na época já se chamava Movimento Ponta do Coral 100% Pública, com a bandeira de criação do Parque Cultural das 3 Pontas. Resgatou também a importância da mobilização social para a conquista e manutenção de tantas áreas verdes e parques da cidade, citando como exemplo o Parque da Luz, o PACUCA e o Quintal Comunitário do Córrego Grande.

Outras militantes também lembraram do histórico das mobilizações pós 2015, quando a Hantei estava “prestes” a construir um hotel. Em 2015 foram dezenas de atividades envolvendo a Ponta do Coral, com reuniões semanais na Escola Básica Padre Anchieta (obrigada Maria Terezinha!), onde os rumos do movimento eram debatidos coletivamente. Recordamos diversas ocupações culturais ocorridas naquele ano, como o Enterro dos Ossos (pós-carnaval) e a Maratona do Coral, quando após o cancelamento da Maratona Cultural feita pela prefeitura, decidimos organizar 3 dias de atividades autogestionadas envolvendo arte e cultura na Ponta do Coral. Anos seguintes também foram lembrados, como a Novembrada Cultural em 2017, resgatando a luta pela Ponta e, ao mesmo tempo, a memória contra a ditadura.

Recordamos também de como foi a batalha para conseguirmos manter a área da Ponta limpa, sem o mato alto que era usado para afastar a população da região e criar pânico. Inclusive dos mutirões de limpeza que fizemos, um dos quais foi interrompido pela Polícia Militar.

Vídeo de 2015, quando a PM de SC interrompeu a limpeza na Ponta do Coral.

Flora Neves, comunicadora, trouxe outro aspecto de porque a área ainda estaria protegida, contando uma história que ouviu de (…), de que mulheres e crianças Guarani teriam sido mortas por colonizadores portugueses nos recifes, e que enquanto a memória dos povos originários que habitavam Meiembipe não fosse respeitada a situação da Ponta do Coral permaneceria em suspenso.

Ao final, também foi lembrado o papel do Movimento Ponta do Coral 100% Pública, em anos mais recentes, na articulação com outros movimentos sociais. Começando com o AbraCidade em 2019, que juntou vários movimentos no PACUCA. Iniciativa que inspirou mais tarde, ainda na pandemia (2021), a articulação de uma rede de movimentos socioambientais locais chamada Tecendo Redes, cujo foco tem sido o combate à especulação imobiliária, e que foi fundamental na organização do encontro, com presença de vários ativistas da rede e seus coletivos (Ecolhar, Instituto de Formação Popular Caéte, movimento contra a verticalização, Movimento de Pequenos Agricultores, Coletivo UC da Ilha).

A roda terminou com uma ratoeira cantada em verso e prosa:

   

Ao final da roda ainda ocorreu a distribuição de material (panfletos e cartazes) para uma manifestação em outubro contra a megalo-marina na beira-mar norte, que está sendo organizada por pescadores e pescadoras artesanais junto a movimentos sociais. A luta contra essa marina é pauta histórica do Movimento Ponta do Coral 100% Pública e sua relação com o mar, pois o entendimento é que se trata da continuidade do projeto de hotel-marina na Ponta do Coral, na mesma linha de modelo de cidade elitista, excludente e ecocida.

No fim da tarde o vento virou para um “nordestão”, apressando o fim do encontro.

O fato é que mudam os ventos, passam as estações, avançam os anos, mas a luta para retomar a Ponta do Coral para o povo segue viva! Se hoje não temos ali um hotel para poucos, é devido ao amor e a luta organizada de tantas pessoas que se entregaram e ainda entregam a esta causa. Hoje muita gente curte a ponta, passeando, namorando e pescando. Ainda não temos o tão sonhado Parque Cultural das 3 Pontas. Mas vamos chegar lá, nem que leve mais 45 anos!

Viva o Parque Cultural das 3 Pontas!

Viva a luta pela Ponta do Coral 100% Pública!

Fotos do Companheiro Chico, do Movimeto Ponta do Coral 100% Pública.

Referências de outros relatos: